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segunda-feira, 15 de julho de 2013

O tempo não muda tudo

*Ouça John Mayer - A face to call home
        
           Encaro você e ouço a brisa que invade nossa pequena casa neste verão. Ontem, eu sentei na cadeira de balanço na sacada e olhei pra imensidão azul que há a nossa frente. Procurei o sentido pra me sentir tão feliz a cada novo dia. Talvez seja o clima ameno desta região, ou o bom café que você passa todas as manhãs que perfuma toda a casa. Talvez seja o fato de, finalmente, me sentir segura em algum lugar. De me sentir inteira, de me sentir de algum lugar. Eu achei o meu lugar. E é maravilhoso poder te olhar enquanto eu preparo o nosso almoço. Você toca John, eu cantarolo e morro de rir quando você erra alguma nota. Aprendi com você e com essa nossa busca inconstante de algum futuro pra nós dois que, nem sempre, faremos as coisas da forma correta. Algumas vezes, tomamos decisões que parecem erradas, mas que são o nosso certo. Você me entende? Mudar de país, se afastar da família e dos amigos, fugir dos fantasmas idiotas que assombravam nossa relação doce e complicada não parecia a saída adequada. Mas a gente preferiu assim. Tomamos um avião e cá estamos nós.
          Sinto falta do calor dos braços da minha mãe, e me sinto morrer quando ligo pra ela pra desejar um Feliz Natal e ela me pergunta: "Filha, você vai voltar esse ano?" No fundo, eu sei que não, porque ir embora significa nos tirar a paz, abandonar o lugar que nos fez melhor; mas eu digo que talvez sim. Olho para o mar da nossa janela e penso em como tudo mudou aqui. Dentro, fora, dos lados e ao avesso. Temos 30 e 32 anos. Quinze anos depois de termos nos conhecido na nossa pequena cidade. Meu cabelo enrolado ainda é o mesmo. O seu cabelo preto parece louro de tão queimado pelo sol. Veja como somos lindos. Pecinhas de uma quebra-cabeças que quase perfeitamente se encaixam. Alguns desgastes e algumas manchas feias compõe o que somos hoje. Meu bem, o tempo passa e muda um montão de coisas. Que bom que só mudou a gente de lugar. Sento pra escrever um pouco e você me dá um beijo na testa. Não trocaria isso por nem um verão solteira. Por que você sabe, eu funciono melhor com você por perto.
          Sobre as decisões que tomamos... Ah! que se danem as decisões. Tudo que eu escolhi, e até os erros que cometi, me levaram até você. Me fizeram, enfim, amar tudo o que há em mim. Não sei se gosto mais de mim ou de você. Mas, isso importa? Não muito, não é? Hoje eu escrevo sobre a nossa vida. Nossos filhos chegam da escola e te beijam o rosto. Que poderia eu querer mais que isso? E que, se um dia eu precisar terminar nossa história, que seja com um final que se eternize.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Eu tomo você

         Hoje, depois de tanto tempo sem voltar na nossa praça, vi você sentado num banquinho com uma velha amiga nossa. Passei por lá sem um propósito, meu destino era pro lado oposto, afinal. E vi você. Não senti borboletas no estômago, nem embrulho nem falta de ar. Mas senti uma dor que me atravessava o peito, que me rasgava como folha de papel. Não sei ao certo se foi de saudade, de medo ou de sei lá o que mais. Você continua lindo. Com a barba por fazer, você vestia uma camiseta branca e usava jeans. Você ainda é o homem mais bonito que eu já vi. Bêbado ou sóbrio, você ainda tem as palavras certas pra me dizer. Isso é um saco. Eu queria mesmo era sair do carro e te beijar. Cheirar. Fumar. Amar. Você. Mas isso é errado, não é? Olha que bela droga de vida você me deixou. Desde aquele dia que eu sai do seu apartamento, eu senti que tínhamos rompido de verdade. Descasquei o esmalte vermelho das minhas unhas enquanto fugia pra casa. Você faz tanta falta. Parece que tem um buraco nessa casa. Suas roupas ainda estão aqui, seu perfume e a chave extra do seu apartamento com um chaveiro de um bonequinho que completa o que você usava (ou usa, eu nem sei).  Era nos dois, você lembra? Sua mãe deu pra gente de presente.
         Sabe, eu tenho umas coisas pra te falar. Nunca senti tanto medo como hoje. Quando vi a silhueta de uma mulher ao teu lado, eu me senti morta. E eu pensei que era pra ser eu. Eu não te superei, eu até tento as vezes, mas é em vão. Eu saio, trabalho, estudo, bebo, leio, escrevo. Mas sempre que eu tenho tempo pra pensar em algo que não seja trabalho ou alguma conta pra pagar, eu penso em você. Em como nós dávamos certos juntos. O quão graciosa era nossa dança e nossa cantoria desregulada em algum dos bares dessa cidade. Você faz uma saudade absurda. Você é uma saudade absurda. Você aquilo que eu sempre quis, e aquilo que eu sempre precisei, e isso é chato de se falar (e piégas), mas é a verdade.
         Quando será a nossa hora certa? Ouço Engenheiros do Hawaii e me lembro de você tocando pra mim. Eu queria encontrar a hora certa, a porta certa pra voltar pra nossa casa. Lembra do nosso plano de casar? Eu nem queria mais casar, então eu me apaixonei por você. Você é incrível, e eu tenho vontade de beijar você a cada novo sorriso que você dá. Você é a prova da criação divina. Isso não é fanatismo. Eu juro. Eu calo a boca enquanto você passa por mim. "Oi. Vamos tomar um chocolate quente?" Só se eu puder tomar você antes.