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quarta-feira, 24 de junho de 2015

Você me esvaziou


*Ouça Ride de Lana Del Rey

          Partir. Ir embora de um lugar que consideramos um dia nosso lar. Pegar um avião que leve a gente pra longe do caos que se instaurou na nossa casa. Eu nunca havia sentido tanta dor ao ter que ir embora como senti quando deixei você. Foi você o sonho mais difícil de desistir, aquele que me fez repensar trocentas vezes se realmente não havia mais como tentar, que me fez perder algumas noites de sono porque meus olhos estavam inundados por água salgada.
          Fui embora, mas queria que você soubesse que se ainda houvesse um por cento de chance da gente dar certo, eu teria ignorado os outros noventa e nove por cento de chance de erro. Mas no fim só havia eu tentando te explicar que eu precisava ir, e você não deve ter ouvido nem metade do que eu disse.
          Se houvesse uma estrada pra me levar pra longe de você, pra longe das coisas que eu imaginei pra nós dois; um lugar longe o suficiente pra não me deixar ter como voltar porque eu senti saudade, porque eu fiquei preocupada com a tua saúde ou porque fiquei compadecida com o seu time que só perde no campeonato; uma estrada de terra batida, uma rota de voo que ninguém descobriu antes de mim... eu iria. Iria pra longe. Mas não há.
          Não há rota de navio, carro, trem ou helicóptero que me arranque as raízes de onde você está. Não parece haver um plano b, c ou z. Não existe nem no alfabeto grego uma letra que intitule uma opção pra escapar de você. E ao mesmo tempo, não tem solução, não tem remédio, não tem mandinga que faça a gente se encaixar.
          Partir. Ir embora de alguém que foi nosso lar. Estou indo embora, vou pegar a estrada pra longe,vou achar uma nova casa. Mesmo que vazia, só preciso de algo pra me proteger da chuva e do sol, dos furacões que a saudade de ti vai trazer, vai fazer revirar os móveis da minha casa nova. Mas ela estará vazia, querido. Mas não tem mal em esvaziar alguém, tem?

sábado, 20 de junho de 2015

You should be


          Você entra silencioso pela porta dos fundos como se não quisesse ser notado. Não tem nada de errado em chegar tão tarde depois de passar tanto tempo longe quando eu não tinha notícia alguma sua. Não tem nada de errado em ser tão distante, em não dizer o que você sente enquanto eu sou um livro de capa transparente que você já leu trinta e cinco vezes e mesmo assim não foi o suficiente. 
          Eu te escondi coisas, noites mal dormidas e umas tantas olheiras que surgiram pós sessões de choro compulsivo. Porque eu chorei muito, sequei minhas reservas de compreensão porque eu sempre tive que entender que você poderia ir e vir quando quisesse, quando lhe conviesse. Porque eu tinha que entender teus defeitos e tuas falhas, porque eu ainda queria muito que no final tudo valesse a pena e a gente pudesse lembrar disso sem mágoa.  
          Preciso lhe dizer que perdi o sono muitas vezes pensando nessas coisas que nunca ficaram tão claras entre a gente, porque o medo cresceu tanto que acabou sufocando qualquer esperança que eu tinha a da gente dar certo. Porque foram muitas frases pela metade, muitas respostas esquecidas, muitas mensagens ignoradas. Porque eu te fiz uma porção de perguntas que você não soube, ou não quis, responder. Porque não dá mais tempo agora. Nem nunca mais. 
          Preciso te contar que ontem eu decidi ir embora. Que pela primeira vez em tantos dias eu aceitei que as coisas nunca começaram pra você como começaram para mim. Que no meio da euforia dessas coisas que você me fez sentir eu acabei não vendo que você não estava com os dois pés no barco enquanto eu já tinha afundado o corpo inteiro. Eu sinto muito. Por você sentir tão pouco, ou me mostrar tão pouco. Por você ter chegado tarde hoje. Talvez se tivesse sido uns minutos mais cedo ainda houvesse tempo pra eu desistir de fugir de você. 
          E agora eu tento fugir mas meus pés não saem do lugar. Mas continuo tentando fugir da tua voz que minha cabeça repete feito um gravador. Eu vou continuar tentando. Porque não tem nada de errado entre a gente, mas o problema é que parece não ter nada de certo também. 
          Você deveria ser certeza. 

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Você é um mar


Ouça Bem mais que a mim, Maria Gadú

          Hoje eu tive medo. Sentei na cama, acordando de um pesadelo com você, e pus imediatamente a mão sobre o coração como quem pedisse pra ele se acalmar. Mas ele não acalmou, continuou batendo descompassado o dia inteiro. E o dia inteiro eu tive medo. Pensei em te ligar, mas me dei conta que perdi o direito de querer saber da tua vida. Perdi o direito até de sonhar com você, porque sempre que isso acontece, sinto meu coração perder um pequeno pedaço e já foram muitos os pedaços que você me arrancou.
          Você chegou depois das minhas promessas de nunca mais abrir o coração pra ninguém. Depois de ter despachado uma porção de caras legais porque eu pus defeito em todos eles, porque nenhum servia pra mim. E aí apareceu você. Que não tinha o meu tamanho. Que não estava disponível. Que tinha uma porção de defeitos que eu passei a adorar como eu adoro qualquer parte sua. Chegou você e eu me virei nos trinta pra caber em você, pra bastar em você. Cortei partes minhas porque talvez você pudesse não gostar, porque eu precisava ser o seu número.
          Hoje eu chorei o que não havia chorado há dias, o que vinha tentando guardar pra mim porque eu sou forte e pessoas fortes não desabam só porque um amor não deu certo. Mas o amor era você, e eu chorei. Eu tentei entender em qual ponto ficou impossível segurar a barra, quando foi que eu fui obrigada a renunciar. Levantei a bandeira branca, pedi paz pro coração que passou a não ter mais nem um segundo de sossego desde que você chegou. Eu queria poder dizer que foi um desassossego gostoso, porque o amor tem essa mania de tirar a gente do eixo, mudar a órbita da nossa vida. Eu quis mais que tudo que tivesse sido assim. Mas não foi, e foi por isso que eu chorei.
          Hoje eu senti bater o medo que senti quando descobri que gostava de você. Pareceu uma boa ideia pra você? Eu não sei, nunca te perguntei. Senti medo de me perder, medo de não saber voltar pra minha solidão cômoda em não gostar de ninguém. Porque, no fundo, todo mundo sabe que é melhor um coração vazio, que não espera, que não se machuca, que não se dói por ausências, que se basta.
         Mas a verdade é que o medo que bateu hoje me fez pensar se eu bastava antes de você. Se era realmente melhor não sentir nada a sentir tudo isso que você me faz sentir. E eu não sei. E foi por isso que eu chorei sentada na cama com a mão sobre o coração. Porque eu não lembro de como era a minha vida antes de você. Antes da esperança, antes da luz, antes do rabisco de paraíso que você me ofereceu quando chegou.
          Se você fosse um mar, eu mergulharia fundo. Tão fundo que provavelmente teria me afogado. Mas você não é mar, apesar de eu achar que vou me afogar. Você também acha isso?

sábado, 6 de junho de 2015

Carta extraviada n° 1

         
          Agora são dez horas e quarenta e três minutos de uma noite qualquer. Agora, eu preferia estar num lugar qualquer onde eu pudesse, e só tivesse, que olhar pra você. E então eu não precisaria dizer nenhuma palavra pois não haveria nada que eu pudesse dizer diante de tudo - desde as pequeninices aos terremotos - que você me faz sentir. Você pode estar sorrindo agora, ou olhando cada palavrinha com uma expressão estranha de quem não sabe o porquê de eu estar escrevendo pra você. É simples. Quando alguém me faz sentir tantas coisas bonitas, me dá vontade de retribuir com coisas mais bonitas ainda. E mesmo que eu te escreva uma carta por dia, durante meses ou até anos, ainda seria tudo muito pequeno perto da luz que tua alma trouxe pra minha poesia.
          Eu queria te ver sorrir. Dedilhar tuas costas nuas com meus dedos pequenos e minhas unhas pintadas de vermelho. Mas eu queria te ver sorrir. Beijar teu sorriso quando você menos esperasse, só pra ter a sensação dos teus lábios felizes sob os meus. Só pra ver nos teus olhos o reflexo do meu cabelo, pra ver se eu combino com tua íris ou se eu só imagino demais.
          Mas eu não sei te dizer quando foi que eu suspirei pela primeira vez por você. Mas depois da primeira, todas as vezes que suspirei tive a sensação de estar em um mar calmo, num dia bonito, com o coração batendo forte sob a pele. Você me faz sentir a paz dos dias de ventania e furacão. Você é paz no caos. É recomeço.
          Pois foi você, e não qualquer outro, que me fez sentir o coração querer dançar de novo. Foi você, e não o menino que me beijou na última festa que eu fui, que me fez pedir calma pra entender o rebuliço dentro da minha cabeça. Não sei o que sinto, mas sei que não sinto pouco. Mas eu queria te escrever algo tão bonito quanto a sensação de lar que tenho quando penso em ti. O tato que procura teu corpo no escuro de um quarto onde você não está. O cheiro de pele tua que fica em mim depois de um abraço que você não me deu.
         Eu, que nunca precisei de ninguém pra me sentir em casa, de repente quis tanto que você fosse a minha. Pra eu morar onde teu eu habita, pra dividir o espaço com a tua respiração. Mas se você me perguntar se eu sei o que eu sinto por você, eu apenas direi que não. Mas eu sei que já vale muito a pena. Você vale a pena.