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domingo, 13 de dezembro de 2015

Eu escrevi um texto sobre sentir

         [Você pode ler este texto ao som de Purpose - Justin Bieber]

          Não faz mal sentir. Sentir-se só. Sentir dor. Sentir saudade. Sentir amor. Sentir raiva. Sentir-se vazio. O que faz mal é essa nossa mania de querer não-sentir-nada. De querer virar um punhado de robôs que vivem automaticamente, beijam automaticamente, e não amam, nem automaticamente, nem roboticamente ou qualquer outro mente que nossa mente seja capaz de criar. Senta aqui, vamos conversar sobre o que é sentir.
          Há um tempo venho me sentindo perdida no mundo. Como se o ontem e o hoje e o amanhã não fizessem sentido algum. Há um tempo tenho me limitado a não sentir nada, nem amor nem empatia pelas pessoas, ora porque elas não merecem, ora porque eu mereço não sentir nada. Porque eu mereço ser livre. Porque eu confundi liberdade com ausência de afeto. Porque quando eu conheci alguém legal, quis jogar. Quis brincar de esconde-esconde como uma criança de cinco anos. Porque eu aprendi que é assim que nós conquistamos as pessoas hoje em dia: brincando de quem se ausenta por mais tempo e desperta mais saudade.
          Dê-me sua mão e escute o que eu vou dizer. Não temos mais cinco anos, e não somos robôs para brincarmos com o coração alheio. Não precisamos esconder a saudade, o afeto e nem a raiva. Porque nós sentimos, e não há mal em sentir.
          Eu conheci alguém legal. Não sei mais se ele era legal porque era legal ou porque eu achei que poderia consertá-lo dos danos do mundo. O primeiro passo era demonstrar interesse, o segundo era demonstrar um pouco de desdém, do terceiro em diante eu deveria fazê-lo me amar. Eu me fiz presente, e logo após ausente, porque essas eram as regras do jogo. Segui direitinho as instruções da caixa. Eu não sei agora se deixei alguém legal passar por mim ou se fiz um grande bem em ter perdido esse jogo.
          Eu deveria conquistar o amor dele. Soletre comigo c-o-n-q-u-i-s-t-a-r. Eu deveria jogar para ter amor. Eu deveria ler o manuel de instruções, mas veja só, ele não tinha um. As ações não foram premeditadas, e, de repente, eu estava sobre solo irregular e desconhecido. Aí eu perdi. Perdi porque não soube o que fazer, porque na ânsia de não sentir, eu precisava ter tudo planejado, tudo sob controle. E, naquele momento, se havia alguém no comando do jogo, esse alguém não era eu. Eu quis jogar porque não poderia me apaixonar por ele, mas ele deveria se apaixonar por mim. Só pra eu ter a sensação que eu curei alguém dessa obsessão de não-sentir-nada. Porque no fundo, quem não sabia sentir era eu. Mas ora, o mundo não precisava saber disso.
          Agora entendo que não há mal em sentir. E mesmo sem saber ainda o que eu faço e devo fazer no mundo, me permito viver um dia de cada vez, e sentir, pausadamente, tudo o que vier pela frente. E não consigo curar ninguém da obsessão do não-sentir-nada, hoje eu só quero ser curada. Sem virar um robô. Eu só quero não brincar mais de não sentir nada. Enquanto eu tiver que decifrar um manual para ser amada, meu bem, eu vou me sentir perdida.

domingo, 22 de novembro de 2015

Hoje eu te quero bem

[Você pode ler este texto ao som de Never Let Me Go - Florence + The Machine]

          Eu acho que chegou a hora. Chegou o grande dia. Estamos em pleno Dia D agora. Chegou o dia em que, em paz, posso te olhar ao lado do seu amor e não sentir raiva, inveja ou tristeza. O dia em que ter saudade de você não significa nada além de 'que bom que ele passou por aqui'. Que bom que ele me ensinou aquilo que sabia. Que bom que ele fez eu me apaixonar por rosas laranjas, apesar de achar as vermelhas lindas. Que bom que ele ficou, que durou, que persistiu mesmo quando eu queria expulsá-lo de mim. Que bom que ele conquistou, fez sorrir, fez gozar, fez amor em mim.
          Passaram-se anos até eu conseguir olhar pra você e conseguir enxergar apenas o garoto por quem eu me apaixonei. Não restou mágoa, nem desavença, nem qualquer outra coisa além da gratidão por ter podido compartilhar com você dias da minha vida. Se você me perguntar se doeu saber que você havia se apaixonado por outra, não poderei dizer um não. Dilacerou o coração, a alma, o amor. Dilacerou a minha confiança em amar de novo. Mas isso é papo pra outro dia, não nosso Dia D. Há quanto tempo algo não é nosso? Há quanto tempo seus amigos e meus amigos não juntam mais nossos nomes na mesma frase? Devo te dizer que um deles fez isso semana passada, e eu pude rir. Rir, amor. Rir porque foi engraçado, porque a tua lembrança causou felicidade e não tristeza nas bandas de cá, e não sorrir pra disfarçar porque tua ausência ainda dói. Você não dói mais, meu bem. Você é o descanso de um amor que deu certo enquanto existiu.
          A gente se apegou ao que havia de mais bonito no outro. Você gostava de deitar a cabeça no meu colo e contar estrelas, e desde então ele não serviu pra mais ninguém ser astrônomo. Eu gostava de brincar com a tua barba, e não achei mais nenhuma que fosse tão bonita e aconchegante quanto a tua. Nenhuma mais pode receber meus beijos carregados de amor. Nenhuma mais roçou no meu pescoço enquanto eu cozinho. Não achei outro amor igual ao nosso, e hoje entendo que nunca irei. E entendo - mais importante - que eu não preciso de outro amor assim. Porque eu tive você, e nossas memórias são tudo o que eu posso querer.
          Eu nunca soube me despedir, nunca fui boa com fins. E me despedir de você nunca foi um desejo. Mas hoje é necessário. Se você me permite, te conto agora que apareceram outros 'alguém'. Em nenhum deles achei o amor, como você. Mas se ainda houver chance de recuperar minha fé no amor, então um novo alguém aparecerá. Se eu pudesse te desejar algo hoje, se eu pudesse faz um pedido pra alguma divindade ou gênio da lâmpada, desejaria que você seja tão feliz quanto eu quero ser. E então você poderá acreditar em mim. Hoje eu não te amo mais, mas ainda te quero bem.
          Eu te quero bem, amor.
          Por favor, seja feliz. Por você. Por vocês.
          Por nós.

domingo, 2 de agosto de 2015

Carta extraviada n°1

[Você pode ler este texto ao som de Humans - The Scene Aesthetic]

          Hoje eu sonhei com você. Foram três as vezes que você me visitou na mesma noite, e eu perdi as contas de quantos sonhos roubaram minha paz e meu sono nesses últimos meses. Não sei quantas vezes pensei em você, não sei te dizer em números exatos o tanto de horas que eu perdi tentando te afastar de mim. Eu aprendi a lidar com a saudade, com a ausência, com a falta de bom dia e boa noite, com o silêncio, mas não sei, não consigo lidar quando você me visita em sonhos. Não sei o que fazer com os pensamentos que ficam depois que eu acordo, sobressaltada, com aquela sensação inquietante de que falta algo. Porque sempre falta.
          Quanto de mim se foi com você? Quanto de nós restou? Se houve, um dia, nós, você deve tê-lo jogado fora, varrido para baixo do tapete. E se eu varrer a saudade que bateu de você hoje para debaixo de um móvel pesado? Você vai embora para sempre? Você promete que não vai voltar, nem para visitas inesperadas durante o meu sono? Por favor, me diz que se eu te expurgar do meu sono, você vai desgrudar do meu coração também. Se você me tem algum apreço, leva embora tudo o que ficou de você comigo. Mesmo que isso seja nada. O teu nada pesa muito por aqui...
          Hoje, especialmente hoje, eu senti sua falta. Falta de rir com você, de te procurar quando algo engraçado ou doido me acontecia. Senti falta de saber que eu faço parte da tua vida. Senti falta e a falta me sufoca. Hoje, eu não sei bem, me senti como se as coisas até agora tivessem consumido tudo de bom que eu tenho. Como se no meio desse furacão, só houvesse restado uma carcaça dura e fria, alheia a tudo e todos ao redor. Fazia tempo que eu não me sentia sozinha, mas hoje eu senti. Como uma ilha autossuficiente, que, no fundo, não consegue se bastar.
          Sei que o dia está no fim, e provavelmente amanhã minha vida seguirá seu curso normal. Vou ao banco, ao supermercado e ao dermatologista, vou ler ou assistir um filme, e então será mais um dia longe de ti. Cada dia a mais é um dia depois do 'nosso' fim. É um dia mais distante do que fomos, ou daquilo que eu quis que fôssemos. Sei que amanhã eu não iria querer escrever sobre isso, sei que eu não quero escrever sobre isso. Sei que perdi a mão pra essas coisas de falar sobre o que sinto, mesmo quando eu sinto muito, falar muito não é mais a minha praia. Mas hoje eu me rendi ao prazer silencioso de escrever sobre você. Pra ver se eu te expulso daqui de vez, e você deixa de invadir meus sonhos. Pra ver se eu me convenço que você só serve pra prosa ou poesia, mas pro amor não.
          Hoje foi só mais um dos dias em que eu senti saudade sua, e eles também acabam. E tudo volta ao normal.

domingo, 12 de julho de 2015

You are firework

[Você pode ler este texto ao som de Number One - Slow Club]

          Calei os lábios e toquei seu cabelo fino que caía despretensiosamente pela sua testa clara. Enxerguei sua íris e me vi refletida nela enquanto você brincava com minha barriga, fazendo subir e descer uma montanha russa no meu estômago, estacionando, depois, bem ali, do ladinho do meu coração. Levei um bom tempo pra conseguir manter a calma em momentos como esse. Quando eu fecho os olhos e sinto a paixão navegar pelas minhas veias, invadindo os órgãos vitais, acendendo meu corpo como fogos de artificio. Você pode tocar a minha mão sem ter medo de que eu te queime, porque você está brilhando tanto quanto eu.
          Você deita ao meu lado na cama, descobre nossos corpos, descobre tudo o que eu não conseguia ser com mais ninguém. Vejo-te sorrir. Dedilho tuas costas nuas com meus dedos pequenos e minhas unhas pintadas de vermelho. Beijo teu sorriso quando você menos espera, só pra ter a sensação dos teus lábios felizes sob os meus. Só pra ver nos teus olhos o reflexo do meu cabelo, pra ver se eu combino com tua íris ou se eu só imagino demais. Quando fecho, enfim, meus olhos, sei que jamais fui olhada e enxergada como fui, e sou, por você.
          Você lê poesia pra mim, e seu sotaque paulista destaca as palavras mais bonitas, e o arrastar das tuas sílabas faz rugir uma escola de samba dentro do meu peito. Ouço tua voz se repetindo na minha cabeça feito um gravador. Transformei teus sons em música pra ouvir sempre que a saudade bater mais forte pro lado de cá. Queria ter-te transformado em tatuagem. Pra te fincar na minha pele que sempre se arrepia quando você olha pra mim e me faz bambear as pernas e suar as mãos. Queria ser oxigênio, pra passear por cada célula do teu corpo, pra fazer par contigo.
          Você adormece em meus braços, não me movo, mesmo que a tua posição vá fazer doer o meu pescoço depois. Vale a pena, porque de tudo que eu poderia ser hoje, teu apoio, teu ombro, teu travesseiro, sei que sou algo bem maior. E você fica lindo dormindo.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Você me esvaziou


*Ouça Ride de Lana Del Rey

          Partir. Ir embora de um lugar que consideramos um dia nosso lar. Pegar um avião que leve a gente pra longe do caos que se instaurou na nossa casa. Eu nunca havia sentido tanta dor ao ter que ir embora como senti quando deixei você. Foi você o sonho mais difícil de desistir, aquele que me fez repensar trocentas vezes se realmente não havia mais como tentar, que me fez perder algumas noites de sono porque meus olhos estavam inundados por água salgada.
          Fui embora, mas queria que você soubesse que se ainda houvesse um por cento de chance da gente dar certo, eu teria ignorado os outros noventa e nove por cento de chance de erro. Mas no fim só havia eu tentando te explicar que eu precisava ir, e você não deve ter ouvido nem metade do que eu disse.
          Se houvesse uma estrada pra me levar pra longe de você, pra longe das coisas que eu imaginei pra nós dois; um lugar longe o suficiente pra não me deixar ter como voltar porque eu senti saudade, porque eu fiquei preocupada com a tua saúde ou porque fiquei compadecida com o seu time que só perde no campeonato; uma estrada de terra batida, uma rota de voo que ninguém descobriu antes de mim... eu iria. Iria pra longe. Mas não há.
          Não há rota de navio, carro, trem ou helicóptero que me arranque as raízes de onde você está. Não parece haver um plano b, c ou z. Não existe nem no alfabeto grego uma letra que intitule uma opção pra escapar de você. E ao mesmo tempo, não tem solução, não tem remédio, não tem mandinga que faça a gente se encaixar.
          Partir. Ir embora de alguém que foi nosso lar. Estou indo embora, vou pegar a estrada pra longe,vou achar uma nova casa. Mesmo que vazia, só preciso de algo pra me proteger da chuva e do sol, dos furacões que a saudade de ti vai trazer, vai fazer revirar os móveis da minha casa nova. Mas ela estará vazia, querido. Mas não tem mal em esvaziar alguém, tem?

sábado, 20 de junho de 2015

You should be


          Você entra silencioso pela porta dos fundos como se não quisesse ser notado. Não tem nada de errado em chegar tão tarde depois de passar tanto tempo longe quando eu não tinha notícia alguma sua. Não tem nada de errado em ser tão distante, em não dizer o que você sente enquanto eu sou um livro de capa transparente que você já leu trinta e cinco vezes e mesmo assim não foi o suficiente. 
          Eu te escondi coisas, noites mal dormidas e umas tantas olheiras que surgiram pós sessões de choro compulsivo. Porque eu chorei muito, sequei minhas reservas de compreensão porque eu sempre tive que entender que você poderia ir e vir quando quisesse, quando lhe conviesse. Porque eu tinha que entender teus defeitos e tuas falhas, porque eu ainda queria muito que no final tudo valesse a pena e a gente pudesse lembrar disso sem mágoa.  
          Preciso lhe dizer que perdi o sono muitas vezes pensando nessas coisas que nunca ficaram tão claras entre a gente, porque o medo cresceu tanto que acabou sufocando qualquer esperança que eu tinha a da gente dar certo. Porque foram muitas frases pela metade, muitas respostas esquecidas, muitas mensagens ignoradas. Porque eu te fiz uma porção de perguntas que você não soube, ou não quis, responder. Porque não dá mais tempo agora. Nem nunca mais. 
          Preciso te contar que ontem eu decidi ir embora. Que pela primeira vez em tantos dias eu aceitei que as coisas nunca começaram pra você como começaram para mim. Que no meio da euforia dessas coisas que você me fez sentir eu acabei não vendo que você não estava com os dois pés no barco enquanto eu já tinha afundado o corpo inteiro. Eu sinto muito. Por você sentir tão pouco, ou me mostrar tão pouco. Por você ter chegado tarde hoje. Talvez se tivesse sido uns minutos mais cedo ainda houvesse tempo pra eu desistir de fugir de você. 
          E agora eu tento fugir mas meus pés não saem do lugar. Mas continuo tentando fugir da tua voz que minha cabeça repete feito um gravador. Eu vou continuar tentando. Porque não tem nada de errado entre a gente, mas o problema é que parece não ter nada de certo também. 
          Você deveria ser certeza. 

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Você é um mar


Ouça Bem mais que a mim, Maria Gadú

          Hoje eu tive medo. Sentei na cama, acordando de um pesadelo com você, e pus imediatamente a mão sobre o coração como quem pedisse pra ele se acalmar. Mas ele não acalmou, continuou batendo descompassado o dia inteiro. E o dia inteiro eu tive medo. Pensei em te ligar, mas me dei conta que perdi o direito de querer saber da tua vida. Perdi o direito até de sonhar com você, porque sempre que isso acontece, sinto meu coração perder um pequeno pedaço e já foram muitos os pedaços que você me arrancou.
          Você chegou depois das minhas promessas de nunca mais abrir o coração pra ninguém. Depois de ter despachado uma porção de caras legais porque eu pus defeito em todos eles, porque nenhum servia pra mim. E aí apareceu você. Que não tinha o meu tamanho. Que não estava disponível. Que tinha uma porção de defeitos que eu passei a adorar como eu adoro qualquer parte sua. Chegou você e eu me virei nos trinta pra caber em você, pra bastar em você. Cortei partes minhas porque talvez você pudesse não gostar, porque eu precisava ser o seu número.
          Hoje eu chorei o que não havia chorado há dias, o que vinha tentando guardar pra mim porque eu sou forte e pessoas fortes não desabam só porque um amor não deu certo. Mas o amor era você, e eu chorei. Eu tentei entender em qual ponto ficou impossível segurar a barra, quando foi que eu fui obrigada a renunciar. Levantei a bandeira branca, pedi paz pro coração que passou a não ter mais nem um segundo de sossego desde que você chegou. Eu queria poder dizer que foi um desassossego gostoso, porque o amor tem essa mania de tirar a gente do eixo, mudar a órbita da nossa vida. Eu quis mais que tudo que tivesse sido assim. Mas não foi, e foi por isso que eu chorei.
          Hoje eu senti bater o medo que senti quando descobri que gostava de você. Pareceu uma boa ideia pra você? Eu não sei, nunca te perguntei. Senti medo de me perder, medo de não saber voltar pra minha solidão cômoda em não gostar de ninguém. Porque, no fundo, todo mundo sabe que é melhor um coração vazio, que não espera, que não se machuca, que não se dói por ausências, que se basta.
         Mas a verdade é que o medo que bateu hoje me fez pensar se eu bastava antes de você. Se era realmente melhor não sentir nada a sentir tudo isso que você me faz sentir. E eu não sei. E foi por isso que eu chorei sentada na cama com a mão sobre o coração. Porque eu não lembro de como era a minha vida antes de você. Antes da esperança, antes da luz, antes do rabisco de paraíso que você me ofereceu quando chegou.
          Se você fosse um mar, eu mergulharia fundo. Tão fundo que provavelmente teria me afogado. Mas você não é mar, apesar de eu achar que vou me afogar. Você também acha isso?

sábado, 6 de junho de 2015

Carta extraviada n° 1

         
          Agora são dez horas e quarenta e três minutos de uma noite qualquer. Agora, eu preferia estar num lugar qualquer onde eu pudesse, e só tivesse, que olhar pra você. E então eu não precisaria dizer nenhuma palavra pois não haveria nada que eu pudesse dizer diante de tudo - desde as pequeninices aos terremotos - que você me faz sentir. Você pode estar sorrindo agora, ou olhando cada palavrinha com uma expressão estranha de quem não sabe o porquê de eu estar escrevendo pra você. É simples. Quando alguém me faz sentir tantas coisas bonitas, me dá vontade de retribuir com coisas mais bonitas ainda. E mesmo que eu te escreva uma carta por dia, durante meses ou até anos, ainda seria tudo muito pequeno perto da luz que tua alma trouxe pra minha poesia.
          Eu queria te ver sorrir. Dedilhar tuas costas nuas com meus dedos pequenos e minhas unhas pintadas de vermelho. Mas eu queria te ver sorrir. Beijar teu sorriso quando você menos esperasse, só pra ter a sensação dos teus lábios felizes sob os meus. Só pra ver nos teus olhos o reflexo do meu cabelo, pra ver se eu combino com tua íris ou se eu só imagino demais.
          Mas eu não sei te dizer quando foi que eu suspirei pela primeira vez por você. Mas depois da primeira, todas as vezes que suspirei tive a sensação de estar em um mar calmo, num dia bonito, com o coração batendo forte sob a pele. Você me faz sentir a paz dos dias de ventania e furacão. Você é paz no caos. É recomeço.
          Pois foi você, e não qualquer outro, que me fez sentir o coração querer dançar de novo. Foi você, e não o menino que me beijou na última festa que eu fui, que me fez pedir calma pra entender o rebuliço dentro da minha cabeça. Não sei o que sinto, mas sei que não sinto pouco. Mas eu queria te escrever algo tão bonito quanto a sensação de lar que tenho quando penso em ti. O tato que procura teu corpo no escuro de um quarto onde você não está. O cheiro de pele tua que fica em mim depois de um abraço que você não me deu.
         Eu, que nunca precisei de ninguém pra me sentir em casa, de repente quis tanto que você fosse a minha. Pra eu morar onde teu eu habita, pra dividir o espaço com a tua respiração. Mas se você me perguntar se eu sei o que eu sinto por você, eu apenas direi que não. Mas eu sei que já vale muito a pena. Você vale a pena.

domingo, 24 de maio de 2015

Carta à Ana, n° 2


          Ana, hoje é um daqueles dias que eu não dou conta de sentir tudo o que sinto e desabo sobre o travesseiro, embaixo do chuveiro, na frente da minha mãe, escondida do jardim de inverno, ou em qualquer outro lugar que possa abarcar o amor que transborda meu peito. Hoje é domingo, Ana, e eu sei que não deveria te escrever a menos que houvesse uma emergência. Mas há, Ana. Tenho urgência do amor dele, e os letreiros neon da cidade denunciam que meu amor tá agonizando numa calçada qualquer. Ele agoniza, finge que vai morrer, e ressuscita, Ana. Estrebucha mas não morre.
          Você deve estar se perguntando o que diabos tem a ver com isso, mas é que é mais fácil escrever uma carta pra te contar do meu amor que escrever uma pra ele. O nome dele não vai pro remetente, se perde no meio de tantas outras, acaba extraviada. Não era pro meu amor se extraviar, Ana, mas é tudo o que tem acontecido com ele. Mas se você me perguntar se eu nunca escrevi nada e mostrei pra ele, aí eu te digo que sim. Já escrevi um monte de coisa sem sentido e entreguei. Acho que ele não guardou nenhuma, Ana. Devem ter virado um daqueles papéis que a gente deixa do lado da mesinha do telefone pra eventualmente anotar um recado, um número, ou usar os espaços em branco pra fazer a lista do supermercado. Ana, me desculpa, só poderia escrever pra você.
          O amor é um inferno, você entende? Porque a gente passa a se preocupar com uns detalhes tão mínimos, tão ínfimos, que nem percebe que chega a ser ridículo. De longe o amor é bonito, Ana, mas de perto parece que um furacão passa diariamente por nós e bagunça tudo, tira a ordem das coisas, e a gente perde aos poucos a inocência porque passa a ver que o amor é bem mais do que mostram os filmes, e é bem mais difícil lidar com ele e mantê-lo viver sem precisar ficar agonizando a cada duas horas como esse meu. Mas o amor é isso, Ana, essa coisa nem tão bonita que faz a gente querer viver pra sempre pra poder dar conta de viver tudo de bom que ele traz.
          Quando ele chega, derruba as barreiras que eu construí pra tentar me manter a salvo dos furacões, terremotos e das tempestades que ele traz consigo. Mas, Ana, é que quando ele chega, varre pra baixo do tapete todas as minhas teorias elaboradas sobre como ir embora. Sobre como fugir dele e disso que a gente têm, antes que seja tarde, antes que seja amor. Mas já é, Ana. E eu nem sei se ainda dá pra escapar disso.
          Quando a risada dele ecoa pela casa, ecoa em mim também. Perfura os tímpanos, ultrapassa a pele, e passa a correr na minha circulação sanguínea. Ele é mais parte de mim do que deveria, talvez merecia. Ele faz retumbar no meu peito uma escola de samba inteira quando ele ri, porque é quando ele ri que eu percebo que mesmo que ainda houvesse tempo, que houvesse um gênio da lâmpada e me concedesse qualquer pedido, que houvesse máquina do tempo pra me fazer voltar e escolher diferente, eu não conseguiria ir embora dele. Porque se Capitu tinha olhos de ressaca, o corpo dele inteiro tinha a capacidade de me prender, me laçar, me arrebatar pra si. Ana, o amor é um inferno de tão bom.

Hoje são 24, amor

       *Ouça Thinking out loud, Ed Sheeran  


         Sonhei com você e deu vontade de te escrever. Saí hoje cedo pra levar minha sobrinha pra tomar sorvete naquela nossa lanchonete preferida, você lembra dela? Senti teu cheiro quando o vento bateu forte vindo lá no norte e de repente pareceu que eu iria topar com você na esquina do nosso primeiro olhar. Acho que nunca desejei tanto que um acaso assim acontecesse, porque hoje, logo hoje, senti meu peito queimar de saudade tua, menino.
          Você lembra de como a gente costumava acreditar que ficaria junto pra sempre? Aquela crença cega de que o primeiro amor será o único. A gente deitava na minha cama de solteiro, e ficava imaginando nosso casamento na beira da praia, na igreja mais bonita da cidade, ou em qualquer lugar que coubesse nosso amor (acho que nenhum lugar seria o suficiente). Eu vestia tua camisa que dava duas de mim, e você sorria porque eu sempre dormia encostada no teu peito. E a gente nunca imaginou que acabaria como acabou. Apenas acabou.
          Faz tempo que a gente não se vê, mas eu posso descrever teus olhos e o contorno do teu maxilar com perfeita maestria, porque eu nunca fui capaz de esquecê-lo. Talvez você se pergunte o porquê de eu estar escrevendo pra você hoje, quando poderia ter dito durante todos esses dias em que a saudade foi a única coisa que ficou entre nós. Quando os silêncios preencheram os horários que antes eram nossos. Quando a ausência foi tudo aquilo que ficou nos espaços onde antes nos tínhamos. Você me tem sempre, em qualquer parte da casa, em qualquer horário do dia. E hoje eu precisava te dizer isso.
          Você aniversaria esse mês, e eu quis tanto bater na porta da tua casa com aqueles cupcakes que a gente comia sentados juntos no chão da tua sala, acenderia uma vela simples, e você assopraria enquanto fazia um pedido. Se eu pudesse pedir por você, pediria à força superior a nós que você conservasse sempre o que há de melhor em você: seu amor. Pela vida, pela música, por mim. Eu quis te dizer que não há presente melhor que ir dormir depois de ouvir tua voz de sono me dando boa noite. Que não há cheiro melhor que o que fica em mim depois de você me abraçar. E que nunca, nunquinha, vai existir alguém que tenha tanto do meu amor quanto você o teve (e ainda tem).
          Já passou da meia noite, e hoje é o seu aniversário. Eu não te mando parabéns, mas eu lembrei. Espero que isso valha alguma coisa, menino.

domingo, 3 de maio de 2015

Carta à Ana

*Ouça Fidelity, Jasmine Thompson

          Ana, enxuga as lágrimas. Ainda é cedo, e eu sei que o domingo chuvoso não ajuda, mas você precisa ouvir o que eu tenho pra te dizer.

          Ana, olha ao redor. Existem infinitas coisas bonitas perto de você. Existe o parque, o carrinho de churros, flores coloridas plantadas pela sua vizinha de quase 80 anos. A vida é mais do que você enxerga agora, eu sei. Você sabe também, mas eu também sei que dói olhar pra tanta luz quando você se sente escuridão. Ana, não chora tanto. Seus olhos são tão bonitos pra você inundá-los de água salgada. Olha pro céu, olha pras nuvens, olha pra mim. Nenhum mar pode te naufragar se você não quiser. Não queira, por favor.

          Você pensa que não vai passar, mas passa. Não, Ana, o amor não é um erro. Não é uma escolha ruim. Eu sei que você queria que fosse mais fácil, eu também queria, Ana. Mas a gente não tem controle algum sobre a vida. E o amor chega pros desavisados, desprevenidos, desligados. Chega quando você abre a porta pra ver as flores coloridas do jardim da sua vizinha. Ele não pede licença, Ana. Você não poderia evitar.

          Hoje eu pus o meu melhor vestido pra vir falar com você, porque você é importante, Ana. Eu não poderia fazer uma desfeita. Eu li num livro que desistir também é um ato de coragem, você me entende? Ir embora às vezes dói mais que ficar. E quando ficar dói mais que ir? Você precisa ir, Ana. Antes que você se afogue no seu próprio amor. Você é intensa, eu sei. Intensa demais pra conviver de meias verdades, meias vontades, meio amor. Quando você sorri, Ana, eu sei que alguém no mundo pode sentir a luz que você emana. Eu sinto daqui de onde estou que sua vida está esvaindo, indo embora de você. Cadê sua luz, Ana? Antes ela brilhava em você. Nos teus olhos, nos gestos, nas unhas de pé. Eu só consigo ver suas lágrimas daqui. Não chore tanto, Ana. Dói em mim.

          Ana, respira fundo. Estou chorando com você. Eu sei o que é se sentir dor quando todos te olham sorrindo, eles acham que você está bem. Mas eu sei que não. Ele tem os olhos lindos, e eles combinam com a boca bem delineada que parece ter sido a obra mais bonita criada pelos dedos de Deus. Mas, Ana, olha pro buraco em seu peito. Ame-se, Ana. Agora, antes que seja tarde, antes que eu não possa te salvar. Tem algo errado com um amor que precisa ser cobrado. A Mariana sabe, a Lúcia e a Raquel também. Você sabe agora. Eu sei também, porque eu sou você, Ana. Todas as mulheres do mundo já foram você. Não desiste. Põe o teu melhor vestido e vai ao parque, Ana. A vida segue. Eu te dou a minha mão se você achar que vai cair. Eu te seguro. Eu sou você, Ana.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Apesar do dia nublado, elas brilharam como você

Ouça Give me love, Ed Sheeran  

          Depois das grandes tempestades sempre vêm os dias tranquilos e assustadoramente bonitos. Depois dos ventos fortes, recolhemos nossos cacos e montamos tudo outra vez. Mas foi só depois do teu sorriso que a guerra foi instaurada aqui dentro. Foi só depois que eu me peguei sorrindo lembrando de uma conversa que me dei conta das pequenas coisas que se acumulavam no meu peito. E apesar dos terremotos que você me fez sentir, eu ainda consigo ficar estranhamente feliz só por pensar nos outros que você vai me causar.
          Foi num dia nublado que eu quis tanto tocar seu cabelo e ajeitá-lo atrás da orelha. Foi ali, vendo as gotas de chuva se acumularem no seu cabelo liso-ralo-meio-claro-lindo que eu quis tanto beijar você. Tocar seus lábios só para ter certeza de que eles eram tão macios quanto eu imaginei. E foi ali, naquele dia chuvoso, que eu quis não pertencer a lugar algum, nem a qualquer pessoa que não fosse você. Logo eu, que nunca permiti que ninguém se sentisse meu dono, quis tanto que você o quisesse, o fizesse. 
          Apesar das nuvens espessas, do dia escuro, eu vi você. E reparei que seu sorriso é torto, e que você sempre joga a cabeça pra trás quando alguma coisa te chateia. E percebi que às vezes você ri mesmo sem motivo aparente. E você consegue ficar ainda mais bonito quando ri. E foi ali, com as gotas de chuva tornando nossas roupas jeans pesadas, que eu não me importei se eu pegaria uma gripe ou se minha maquiagem borraria. Eu só queria beijar você.
          Mas foi só quando eu voltei pra casa e tive vontade de te ligar pra você vir assistir meu filme preferido que me dei conta de que estava apaixonada. E fazia tanto tempo que não sentia isso. O formigamento na boca, o nó na garganta que se forma quando você diz algo bonito e que me desconcerta. A incerteza do que dizer, a sensação de parecer sempre tola diante dos teus olhos. Foi ali que eu percebi que a mulher que eu era havia sido reduzida a uma menina apaixonada. 
          Mas não tinha problema porque o menino era você. E apesar das nuvens, da neblina e da poluição eu pude ver você. E apesar de não haver estrela alguma no céu, quando eu toquei sua mão, pude jurar que todas elas brilharam para nós.

domingo, 4 de janeiro de 2015

Mil estrelas e mil gotas d'água

        Ouça Thinking out loud de Ed Sheeran

          Você chegou como uma maré mansa. Lambeu a terra dos meus pés, alcançou minhas pernas e depois a cintura. Mas não fez mal. Não tive vontade de voltar correndo pra barraquinha pra me proteger do sol e da água. Não tive necessidade de secar as pernas e não me incomodei com a roupa molhada. Não me importei com a maresia e nem com o estrago que aquele dia faria com o meu cabelo. E a verdade é que você não trouxe estrago algum. Fez-me gostar mais de molhar os pés na água do mar; fez-me gostar de caminhar na areia sem ficar reclamando quando ela estava quente demais.
          Já tive homens que viraram minha cabeça; já tive outros que bagunçaram a cama e a casa toda; mas nunca, digo nunca, nunquinha, havia tido um que colocassse tudo em seu devido lugar. Que devolvesse a ordem que todos os dias anteriores haviam tirado de mim. Já chorei como um bebê faminto quando um desses que só sabia bagunçar a cama, bagunçou a cabeça e o coração também. Já entreguei tudo de mim; já recebi tudo de alguém. Mas foi só com você que a balança se equilibrou. Que não houve nada demais. Nada além do que precisei para me permitir transbordar por alguém. Houve excesso de olhares, houve excesso de gargalhada. Houve toque sincero, calmo e penetrante. E não houve um dia sequer que eu tenha voltado insatisfeita para casa. Porque você me deu tudo aquilo que poderia; pois eu tive tudo aquilo de que precisava.
          Se hoje você me dissesse que partiria amanhã, eu te deixaria na rodoviária ou no aeroporto. Te abraçaria com meus braços quentes e te faria sentir que sempre que quisesse voltar teria meus braços pra te aquecer. Se você partisse amanhã, pediria umas fotografias suas ao sol. A luz do dia faz tão bem pra você. Quando os raios solares cruzam o ar e atingem seu corpo, posso jurar que você tem a pele cintilante. O cabelo meio dourado meio castanho, os olhos claros e a boca bem delineada. Tudo em você atrai meus olhos, minhas mãos, minha boca. Se você partisse amanhã, eu ainda cantaria a nossa música com o mesmo brilho nos olhos da primeira vez.
          Se tirassem uma fotografia do meu coração no dia da sua partida, ele estaria tão bonito quanto todos os dias que você ficou aqui, deitado comigo no tapete vermelho da minha sala. Porque você não chegou pra arrumar momentaneamente e depois arrebentar todos os reparos e aprofundar minhas cicatrizes. Você ficou para curar as feridas que ainda estavam abertas. Sorrateiro, silencioso.
          Você veio como uma brisa da manhã; como um orvalho que cai ao entardecer. Você me tirou o medo da perda, me fez crer nos recomeços e me fez não tropeçar nos próprios pés tentando achar alguém que me amasse logo após de eu findar um romance, emendando sempre um no outro. Ainda quero amor, ainda quero ser amada com urgência e profundidade, ainda quero tudo que sempre quis, mas hoje sei aquilo que mereço ter. E se eu pudesse pedir algo pra uma força superior a mim, eu pediria apenas que eu merecesse ter você. Por favor, não parta amanhã.