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domingo, 2 de agosto de 2015

Carta extraviada n°1

[Você pode ler este texto ao som de Humans - The Scene Aesthetic]

          Hoje eu sonhei com você. Foram três as vezes que você me visitou na mesma noite, e eu perdi as contas de quantos sonhos roubaram minha paz e meu sono nesses últimos meses. Não sei quantas vezes pensei em você, não sei te dizer em números exatos o tanto de horas que eu perdi tentando te afastar de mim. Eu aprendi a lidar com a saudade, com a ausência, com a falta de bom dia e boa noite, com o silêncio, mas não sei, não consigo lidar quando você me visita em sonhos. Não sei o que fazer com os pensamentos que ficam depois que eu acordo, sobressaltada, com aquela sensação inquietante de que falta algo. Porque sempre falta.
          Quanto de mim se foi com você? Quanto de nós restou? Se houve, um dia, nós, você deve tê-lo jogado fora, varrido para baixo do tapete. E se eu varrer a saudade que bateu de você hoje para debaixo de um móvel pesado? Você vai embora para sempre? Você promete que não vai voltar, nem para visitas inesperadas durante o meu sono? Por favor, me diz que se eu te expurgar do meu sono, você vai desgrudar do meu coração também. Se você me tem algum apreço, leva embora tudo o que ficou de você comigo. Mesmo que isso seja nada. O teu nada pesa muito por aqui...
          Hoje, especialmente hoje, eu senti sua falta. Falta de rir com você, de te procurar quando algo engraçado ou doido me acontecia. Senti falta de saber que eu faço parte da tua vida. Senti falta e a falta me sufoca. Hoje, eu não sei bem, me senti como se as coisas até agora tivessem consumido tudo de bom que eu tenho. Como se no meio desse furacão, só houvesse restado uma carcaça dura e fria, alheia a tudo e todos ao redor. Fazia tempo que eu não me sentia sozinha, mas hoje eu senti. Como uma ilha autossuficiente, que, no fundo, não consegue se bastar.
          Sei que o dia está no fim, e provavelmente amanhã minha vida seguirá seu curso normal. Vou ao banco, ao supermercado e ao dermatologista, vou ler ou assistir um filme, e então será mais um dia longe de ti. Cada dia a mais é um dia depois do 'nosso' fim. É um dia mais distante do que fomos, ou daquilo que eu quis que fôssemos. Sei que amanhã eu não iria querer escrever sobre isso, sei que eu não quero escrever sobre isso. Sei que perdi a mão pra essas coisas de falar sobre o que sinto, mesmo quando eu sinto muito, falar muito não é mais a minha praia. Mas hoje eu me rendi ao prazer silencioso de escrever sobre você. Pra ver se eu te expulso daqui de vez, e você deixa de invadir meus sonhos. Pra ver se eu me convenço que você só serve pra prosa ou poesia, mas pro amor não.
          Hoje foi só mais um dos dias em que eu senti saudade sua, e eles também acabam. E tudo volta ao normal.

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