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terça-feira, 7 de outubro de 2014

Você nunca estará em uma agenda

*Ouça Heart Like Yours de Willamette Stone

          Rubem Alves certa vez escreveu que "aquilo que está escrito no coração não necessita de agendas porque a gente não esquece". Porque aquilo que amamos se eterniza. E olha pra mim, olha agora. Tô te citando Rubem Alves e eu não preciso de agendas para te lembrar. Tô te dizendo que mesmo com tudo de errado que a gente fez, foi amor. Puro, intenso, animal. Mesmo que a gente tenha caído nessa roda viva do dia a dia, mesmo que tenhamos ferido um ao outro, mesmo que tenhamos guardado os presentes que trocamos numa tentativa - frustrada - de arrancar o outro de si, eu sei que foi amor pra você também.

          Eu sei que você um dia desejou que tivesse sido diferente. Que tivesse dado certo, eu sei. Sei que tu sentiste saudade do cheiro do meu cabelo, mesmo que tu nunca tenhas me ligado pra contar. Sei que um dia você se perguntou qual foi a merda que a gente fez pra deixar nosso relacionamento chegar a esse ponto. Sei que um dia você me odiou por eu tê-lo amado e mesmo assim não ter sido capaz de lutar o suficiente. Eu também te odiei. Odiei o dia que você disse que ia embora e que não era pra eu ir atrás de você. Nós já estávamos perdidos, eu sei. E eu poderia ter ido atrás de você. Poderia ter argumentado com você, ter te feito brigadeiro e aí nós iríamos comer sentados no chão da sala de estar. Mas eu tive que te odiar pra saber o quanto amava você.

          E eu não quero te esquecer. Mesmo que pudesse fazê-lo. Há um lugar na minha vida que sempre será seu. Mesmo que você nunca volte a tocar a minha campainha. Mesmo que eu me mude no ano que vem, e você se torne doutor-fulano-de-tal. Mesmo que a gente nunca se encontre num desses cafés da vida pra conversar amenidades. Mesmo que você nunca mais tome café numa terça-feira de manhã. Mesmo que eu me apaixone de novo e tire da órbita do meu pensamento o gosto e a maciez que teus lábios têm. Mesmo não havendo pra sempre. Mesmo que você me esqueça, eu não vou me esquecer de você. E acho que é aí que mora meu amor. Quieto e sereno, ele sempre vai estar aqui, guardado em um canto morno dentro de mim.

          Mesmo que um dia você passe por mim e não reconheça o meu perfume, eu ainda vou saber quem é você. Talvez você não saiba, ou não se importe, mas eu espero que você seja feliz. Porque, num determinado momento da vida, você enxerga que o importa é aquilo que foi cultivado na sua vida. E que as pessoas sempre partem, mudam de rumo, e cabe a você, que as ama, deixá-las seguir em frente. E você me cultivou flores. Lindas. E elas são tudo aquilo que eu ainda quero de você. Porque apesar de eu nunca querer te esquecer, isso não significa que eu queira lembrar de você.

Eu juro que telefonaria

*Ouça Can't take my eyes off you de Lady Antebellum

          Hoje, depois de tanto tempo, olhei fotos nossas e senti o peito arder em demasia. Num primeiro momento eu achei que fosse saudade, depois me ocorreu que fosse rancor, mas, agora sei que o que dói é o vazio. A ausência. Da esperança, do abraço, das certezas, dos sonhos palpáveis, das manias meigas e um tanto esquisitas, dos teus olhos miúdos. E juro por Deus que sentir algo ainda me dói mais que tua ausência.

          O espaço vazio na cama eu preencho, já no coração, não. E tu fazes falta. E a minha vida é um quebra-cabeças com milhares de peças perdidas sem você. E eu preferia mil vezes quando eu não sentia nada. Hoje eu sinto tudo. Eu sinto muito. Sinto tanto. Sinto por nós dois. Amar sozinha é uma sina, quase um dom.

          Mantenho-me longe e estou tão perto de ti. E tu não me vês. Eu nunca fui embora, e eu sempre esperei que você me enxergasse. Hoje eu ando só, faço da minha solidão inquietamente silenciosa a minha maior companhia. Leio meus livros e escrevo quando me dou conta de que minhas lágrimas transformaram-se em palavras com o passar do tempo. Palavras doídas, adagas, sôfregas. Não choro, não. Não sinto escorrer em minha pele alva nem uma gotícula de sal.

          Mas eu choro por dentro. No caminho da faculdade ou da casa dos meus pais. Choro quando leio um livro e penso que, acaso você estivesse aqui, eu dividiria minha frase preferida com você e você sorriria debilmente para mim e me chamaria de melosa. Quando vou a padaria eu compro pão francês, pão de queijo e pudim de leite. Com muita calda - como você gosta. E você sabe que eu não gosto de pudim, mas eu compro pois era minha rotina te oferecer doce quase todos os dias.

          Não sei, enquanto te escrevo no bloco de notas o rádio toca Can't take my eyes of you, e, pela primeira vez em anos, sinto meu peito explodir numa overdose de adrenalina e saudade sua. E eu te telefonaria se não fosse tão tarde e se eu não soubesse que você odeia ser acordado na madrugada.