Páginas

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Alguns milhares de segundos

Ouça I won't give up, Jason Mraz 

          Fiz as contas e foram 4872 as horas que passei ao teu lado. Não sei ao certo quantos foram os momentos que ri, e quantos foram os que chorei. Minha memória recorda ao menos duas vezes por dia a doçura do teu sorriso, e eu derreto em sal às vezes. Dentre todas as coisas que vivi nos últimos anos, estou certa que tu foste uma das mais bonitas. Não posso e não vou comparar esse amor com nada que vivi antes. Eu sempre falei de vazios e pesos, mas você preencheu todos as lacunas da minha vida e seria cruel não dar-te mérito por isso. Os pesos, bem, ele tornaram-se mais leves (ou teria eu aprendido a lidar com eles?).
          Foram 292.320 os minutos que pude te ter para mim. E nesse pequeno infinito de minutos eu te dei todo o amor que havia em mim. Sequei até a última gota do poço de afeto que construí enquanto esperava alguém que merecesse tomar do meu amor. Feri-me um durante todos esses minutos mas não foi nada incurável. Li em algum lugar que amar é atirar-se de um precipício e esperar que alguém impeça nossa iminente queda. Talvez essa tenha sido a definição mais dolorosa e fidedígna que o amor recebeu. Pois eu e tu sabemos que eu estava à beira de um precipício quando descobri que amava você.
          Durante esses dias, horas e minutos que estive sobrevivendo à beira do meu abismo particular, acabei aprendendo a cuidar dos meus ferimentos e a esconder as cicatrizes dos amores inacabados que vivi. Comi, respirei, gorfei, dormi, dei, chovi, bebi, gozei, dividi, gemi amor durante 17.539.200 segundos. Fui mais por ti, para ti e contigo. Adormeci em teu abraço e me encharquei no leu afeto. Afoguei-me na água que escorreu entre nós naquela noite de janeiro. Não sei quando foi que eu saí da nossa estrada e capotei no acostamento. Não sei o que te aconteceu depois que eu saquei pelo para-brisa. Se vocês se machucou muito ou pouco eu não sei. Apenas espero que você tenha aprendido a cuidar de feridas como eu tanto quis te ensinar.
          Talvez um dia você olhe para o lado esquerdo da tua cama e sinta falta de alguém. Talvez, numa noite qualquer, você sinta a necessidade de um cafuné e não tenha ninguém para fazê-lo. Talvez um dia você pegue uma gripe chata e sinta falta de alguém para cuidar de ti. Talvez um dia você sinta um aperto no peito, e sinta um arrepio frio tomar-lhe conta do corpo e você procure alguém para lhe acalmar de uma crise de ansiedade, e não haverá ninguém. Quando você sentir isso, saiba que sou eu deixando você. Apesar dos milhões de segundos que passei ao teu lado terem sido lindos, eles serão apenas lidos por você através dessa carta a partir de hoje. Reforce os muros do seu coração e fique bem.
                   
                                                                                                                            Adeus,
                                                                                                                            Capitu.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Capitu é espinho - E a culpa é sua

         
          Começo mais uma carta a ti dedicada dizendo que a falta do teu amor secou as flores que eu plantei, reguei e esperei por tanto tempo. Hoje eu sentei na varanda de casa e olhei pra imensidão azul do céu. Enquanto encarava as nuvens, lembrei de como gostava de ficar deitada do teu lado sem falar nada. Só ouvindo tua respiração e sentindo o calor dos teus braços no meu corpo. Escuto uma música calma mas algo grita dentro de mim. Preciso mais uma vez te escrever, me perdoe pelo incomodo. 
          Dentre todas as coisas que já foram ditas e sentidas, depois de todas as minhas cartas de despedida e de todo choro em vão derramado, eu só vim mais uma vez dizer que ainda admiro a beleza da tua alma. Calada, num canto qualquer de uma sala escura, eu ainda lembro da falta que tu fazes e de como dói amar-te de longe. Hoje, durante uma conversa com um amigo, ouvi uma frase que fez minha alma doer. "Capitu confunde não querer com não mais sentir, não merecer com não mais amar." Capitu sou eu, e quem não merece é você. Se eu fosse dizer os motivos pelos quais me apaixonei por você, talvez cometesse o erro de esquecer algum. Mas, meu amor, eu sei bem quais os motivos que te fazem não merecer o meu amor.  
          Vivo o dilema de lidar com esse amor todos os dias. De acordar atrasada e mesmo assim pensar em você, mesmo que seja só por alguns segundos. Não posso te escrever sobre como meu coração está despedaçado desde que você se foi. De fato despedaçado ele não está, mas garanto que a dor de senti-lo bater enquanto o seu bate longe de mim é sufocante. Talvez você tenha sido a melhor coisa que me aconteceu nesses dois anos turbulentos da minha vida. Mas talvez você tenha sido a causa da minha maior dor: a de perder a fé no amor. 
          O relógio prata da minha sala de estar marca 23h48 minutos, hoje, dia 13 de abril, foi mais um dia de saudade. E todo esse blá blá blá de amor e coração pseudo-ferido é clichê. Mas olha, eu andei pensando na melhor forma de te pedir pra ir embora. Pois não posso lidar com a dor de um amor unilateral, que só me suga e nada me dá. Mas aí eu lembrei de um outro trecho da minha conversa de hoje. Eu não te deixo ir, pois o pouco que tenho de você em memórias doces é o suficiente pro meu amor ainda se manter vivo. Guardado em algum canto de mim, ele continua sobrevivendo as minhas custas, e eu acabo mandando todo mundo que chega ir embora, pois o que há de você em mim ainda é melhor que tudo que há lá fora. 
          Os amores incompletos que vivi, inclusive o teu, me transformaram em alguém que eu jamais imaginei ser. Tenho espinhos por toda a extensão da minha pele, e eu ando ferindo qualquer inocente que tenta se aproximar. Eu sou batalha longe de você. Sou guerra declarada, e causa perdida. Sem teus olhos calmos eu não sou fera, nem bela, nem nada. Mas em canto qualquer daquela sala escura eu me recomponho. E continuo, mesmo sem você. 

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Barba


          Hoje eu senti saudade de você. Assim, como quem sente um arrepio despretensioso na pele, daqueles que vem durante uma noite em que a temperatura caiu um pouco, sabe? Foi assim. Sentei numa cadeira do lado direito do ônibus, como de costume, ao lado da janela (eu adoro sentir o vento no rosto, você lembra disso?) e pus os fones de ouvido. Uns dois pontos depois subiu um moço que me lembrou você. Ele tinha a barba por fazer, meio torta e desregulada, assim como era - é, na verdade - a tua. 
          Você detestava quando eu falava que tua barba não era completa, e eu sempre ria da cara de marra que você fazia. Daí, por ironia do destino, ele sentou ao meu lado. E foi impossível não inspirar o cheiro gostoso que sua pele emanava. Ele era branco, tinha os dentes bonitos e os lábios dele tinham um contorno mais bonito que qualquer nuvem desenhada pelos dedos de Deus. Ele me lembrou você por que o sorriso dele se encontrou com o meu, como quando acontecia conosco durante a aula de matemática. E foi aí que eu senti saudade. Muita saudade.
          Deu saudade de poder brincar de morder teus dedos e teus lábios. Deu saudade de brigar com você por conta dos seus péssimos hábitos alimentares. Deu saudade de te fazer uma visita e ficar encostada no teu ombro até tarde da noite. Deu saudade de sentar no sofá da sala e esperar você chegar aqui com teu melhor perfume - o mesmo que eu senti no moço do ônibus. Deu saudade de ser tua, assim, de me sentir tua. Não sei se isso tem cura - essa saudade que bate repentinamente -, mas eu espero que não dure a noite inteira. Durante os cinquenta e cinco minutos que eu passei do lado daquele moço, de quem eu não sei o nome nem a idade, eu senti falta de tudo que eu sonhei ao teu lado. De cada pedacinho dos nossos dias juntos. Daí eu resolvi escrever pois eu não poderia deixar de contar e eternizar o dia em que eu achei alguém tão bonito (ou pelo menos quase) quanto você. 
          Eu sinto falta da tua barba. Dos pelos que crescem desordenados. Das cócegas que eles juntos faziam no meu pescoço desnudo. Do cheiro de homem com corpo de menino que você tem. Sinto falta dos beijos calmos, dos ferozes e dos urgentes. Dos desejos maiores que eles despertavam. Sinto falta da tua barba por fazer, apesar de amar quando você ficava sem barba e eu beijava teu rosto liso e macio. Mas sinto mais falta da tua barba; dos dias que não a vejo; dos dias (que ainda nem chegaram e já me doem) que eu continuarei sem vê-la. É, não é fácil sentir falta da tua barba, menino.
          O moço desceu no mesmo ponto que o meu, mas eu atravessei a rua e ele foi pro sul. Seu cheiro (o teu e o dele) se dispersou com o vento e a sua barba se perdeu entre as pessoas que eu deixei pra trás. Poderia terminar dizendo que eu sinto saudade de você, e que, de vez em quando, quase sufoco com essa saudade, mas não vou não. Termino, ao som de Paulinho Moska, dizendo que eu pensei em te esquecer e esquecer da tua barba bonita, mas só de pensar em esquecer eu já lembro muito e isso dói. Prefiro não pensar mais. Vai que um dia eu encontro o moço da barba bonita e do cheiro gostoso e ele senta ao meu lado de novo? Vou tentar não pensar (e torcer). Sinto falta da tua barba, moço.