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quarta-feira, 11 de outubro de 2017

sol e sal

eu guardei o primeiro olhar afetado que ganhei de você. foi numa sexta, num dia quente, como são a maioria dos outros dias nas cidades que ficam perto da linha do Equador. mas não foi o sol que derreteu as travas de açúcar do meu coração. foi você. seu olhar afetado. e teu sorriso pretensioso.

você me pôs em banho-maria, derretendo cada célula do meu corpo até que ele todo fosse melaço, e eu fosse líquido e nada mais nas suas mãos. você moldou suas esculturas comigo. esperou que eu me solidificasse outra vez, só pra me ver derreter na tua boca depois. eu não quebrei suas expectativas: eu derreti.

um dia você me disse que se eu olhasse pro céu enquanto o sol estivesse à pino e logo depois olhasse pra coisa que eu mais gosto no mundo, eu conseguiria vê-la com nitidez, apesar da luminosidade ter prejudicado temporariamente minha visão. eu demorei a acreditar em você. até que um dia, num desses momentos que o trânsito emperra e o carro para, eu testei. encarei o sol pela janela do carro e depois mirei você. todas as suas linhas, espinhas e dentes estavam lá, nítidos, em viva cor. na minha frente, só havia você.

foi ali que eu entendi que eu poderia encarar o sol outras mil vezes se logo após pudesse olhar você. assim como posso te encarar com chuva, neve ou só geada. posso te encarar no escuro, a meia luz e com a luz acesa.

morar perto da linha da Equador não me preparou pro que é conviver com teu olhar afetado. esse sim me desfaz, viro mar e sal, e só por ti.

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